4 de novembro de 2014

Visita de Robert Avé-Lallemant às Missões (1858)

Robert Christian Barthold Avé-Lallemant (Lübeck, 25 de julho de 1812 - Lübeck, 10 de outubro de 1884) foi um médico e explorador alemão. Em 1836 estabeleceu-se no Brasil, como médico no Rio de Janeiro.
Em Lübeck teve contato com Alexander von Humboldt, que o convidou para participar da expedição Novara para o Brasil. Avé-Lallemant abandonou a expedição no Rio de Janeiro, iniciando então a viajar sozinho pelo Brasil. Estas expedições foram apoiadas pessoalmente por D. Pedro II.



Nas Missões, visitou São Lourenço, Santo Ângelo, São João Batista, São Luiz Gonzaga e São Miguel.

Litografia de Alfred Demersay, 1846

Em seu livro Viagem ao Sul do Brasil, ano 1858 registrou sua chegada a São Miguel:

"Subitamente me encontrei numa praça bastante ampla, de uns mil pés de largura e de comprimento e vi um quadro, nesta região, tão surpreendente quanto melancólico.

Diante de mim, uma velha igreja, construída de pedra vermelha, de proporções tão grandiosas quanto nobre, porém já em ruínas. 

Seis largos degraus conduziam aos cinco arcos da entrada de um magnífico peristilo de 64 pés de largura e 28 pés de profundidade, como um arco lateral de cada lado.

Segue-se depois o lanço de parede da igreja propriamente dita, de cerca de 80 pés de altura com nichos e seis meias pilastras e vários trabalhos ornamentais de pedra.

A igreja tinha três portas de entrada. A nave central media 132 pés de comprimento e 30 pés de largura e era ligada por sete arcos, cada arco com seis pés de largura, com ambas as naves centrais, cada uma das quais era de 20 pés de largura. Entre as ligações de arcos havia pilares quadrados de oito pés de espessura e de largura, todos muito bem lavrados e ornamentados. Tudo isso ainda existe, mas o teto desabou.

A torre do lado direito da igreja ainda se acha de pé, com três andares e cerca de 110 pés de altura por 40 de largura e espessura. É toda ornada de meias colunas, vários trabalhos em pedra e bonitos relevos, que lhe dão uma esplêndida aparência.

Ao lado do templo outrora tão soberbo, uma praça cercada por um alto muro de pedra lavrada. Atrás dele e atrás da igreja, o colégio dos jesuítas, construído em grandiosas proporções. Atrás de tudo, um grande pomar, hoje completamente abandonado.

E essa construção, engenhosa e gigantesca, ali estava convertida em tristes ruínas! O teto dos Propileus e da abóboda estavam totalmente desmoronados. No chão da casa de Deus viçava um pequeno bosque, através do qual havia veredas de arco a arco, de pilar a pilar.

Maravilhosas borboletas esvoaçavam sobre as ruínas e no alto, nos mais elevados pontos, os pássaros da floresta chilreavam a sua canção de tarde sobre a solidão profunda, grave, premonitória.

Assim estava diante de mim em 2 de abril, sexta-feira da Paixão, o outrora célebre colégio dos jesuítas, uma das tão faladas e hoje quase mitológicas Sete Missões ou ainda mais usualmente Sete Povos da margem esquerda do Uruguai superior.

Saindo-se dos magníficos restos desse templo e examinando-se as brenhas do antigo parque, encontram-se em toda parte inúmeras obras de alvenaria de pedra lavrada, verdadeiros muros pelásgicos, pois aqueles que os construíram chegaram também por mar e por mar saíram, deixando atrás de si os pujantes monumentos arquitetônicos.

A sexta-feira da Paixão, o silêncio da floresta, a hora da tarde de um dia claro, o chilreio dos pássaros nas pedras em ruínas em toda parte e as lindas plantas que viçavam em todas as cornijas elevaram maravilhosamente o profundo acorde menor que pulsava em minha alma.”




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