10 de fevereiro de 2014

Os 30 povos das Missões - parte II

Há mais de 400 anos, em terras do Brasil, Argentina e Paraguai, Jesuítas e Guaranis construíram uma história sem precedentes, que impressiona a cada nova descoberta. E ainda há muito para se descobrir.

Não há dúvidas, o legado missioneiro está presente na escultura, na arquitetura, nos patrimônios materiais, que saltam aos olhos. Porém, a maior herança está presente na maneira de ser dos herdeiros desta história, nos elementos básicos da cultura gaúcha, argentina e paraguaia, nos heróis, no imaginário e na fé.

San Ignacio Guazú (1609); Encarnación de Itapua (1615); San Cosme y Damián (1632); Santa María de Fe (1647); Santiago (1651-1669); Jesús de Tavarangue (1685); Santa Rosa de Lima (1698) e La Santísima Trinidad de Paraná (1706).

30 povos missioneiros e território alcançado por suas estâncias
Hoje vamos passear pelos povos jesuítico-guaranis da vizinha Argentina. Chama atenção o quanto a história destes povos se mistura com a história de diferentes municípios brasileiros:

Nuestra Señora de Loreto (1610)


Foi fundada em 1610 pelos jesuítas José Cataldino e Simón Maceta. Foi um dos povoados jesuíticos mais importantes, pela sua grande produção e preparo de erva-mate e por haver contado com a primeira imprensa da época. Depois da expulsão dos jesuítas sucederam-se saques e incêndios, o que provocou a migração dos seus habitantes.

Suspeita-se que lá tenha sido criada a primeira prensa literária de toda a América Latina, onde foi impresso grande número de livros.

Foi fundada por volta de 1610 na região de Guayrá, e transferida por causa de ataques de bandeirantes, definitivamente estabelecida na região atual em 1686. Foi declarada Património Mundial em 1984.

As ruínas cobrem uma área de 75 hectares. Como outras missões, apresenta um caminho ordenado ao redor da praça com Igreja, sacristia, casa dos padres, escola, cemitério, pomar. A igreja tinha três naves com uma cúpula sobre o transepto e uma  capela dedicada à Nossa Senhora com uma imagem da Virgem de Loreto coroando a porta da frente. O campanário era único pela sua monumentalidade.

Há restos de latrinas (foto) e tubulações de irrigação, o que dá algumas evidências arqueológicas importantes da vida cotidiana nas missões.


Concepción de la Sierra (1619)



Nossa Senhora da Concepção (hoje Concepción de La Sierra) foi fundada pelo padre Roque González em 8 de dezembro de 1619. Hoje, o município encontra-se num processo de recuperação e valorização do patrimônio material e imaterial relacionado ao período guarani-jesuítico.

Da antiga redução de Concepción de La Sierra originara-se Santo Ângelo Custódio (hoje Santo Ângelo-RS).

Assim como em muitas outras reduções da Argentina e Paraguai, as antigas habitações dos índios, são utilizadas atualmente, relembrando, a todo o momento a experiência missioneira ali desenvolvida.

O município atual faz fronteira Fluvial com os municípios Gaúchos de Pirapó e São Nicolau através do Rio Uruguai.


Corpus (1622)

Corpus ou Corpus Christi foi fundada em 1622, pelos Padres Pedro Romero e Diego de Boroa, num afluente, à margem esquerda, do rio Paraná. 

Essa Redução acolheu os índios remanescentes da redução de Natividade, que tinha sido destruída pelos bandeirantes paulistas. Inseguros com relação a localização inicial do povoado, mudaram-no para as margens do rio Uruguai, em 1647, para depois, em 1701, o transferirem para o norte do Curupaity. Em 1657 tinha uma população de 1.331 pessoas e 55 bocas de fogo.

O cemitério da cidade atual ocupa parte da praça da antiga redução. Da área da sacristia e capela-mor altos montes de adobe são observados. O cemitério jesuíta detém os restos de muros em torno, traços da Capela de Todas as Almas e também é observado o Cotyguaçu (casa das viúvas). O templo, as oficinas, o cemitério e algumas habitações que cercavam a praça são mantidos até hoje. Na periferia persistem importantes depósitos de  adobe- tijolo, olarias e aterros.

Santa María la Mayor (1626)

 


Foi fundada em 1626 pelos jesuítas Cláudio Ruyer e Diego Boroa.

A redução de Santa Maria mantém vestígios arquitectónicos. Exibe paredes de grande dimensão e excelente qualidade técnica, restos de capelas, lagoas, valas e estradas. É notável estado de preservação dos restos da residência, oficinas e templo temporário, já que o original foi destruído por um incêndio no início do Séc. XIX. Persiste um túnel de passagem subterrânea nesta redução.

É um Monumento Nacional desde 1945. As suas ruínas foram declaradas Patrimônio Mundial em 1984.


Yapeyú (1627)

  

N. S. de Yapeyú, ou N. S. de los Tres Reyes de Yapeyú, foi fundada pelos Padre Pedro Romero e o Provincial Durán Mastrilli, em 1625, na margem direita do rio Uruguai, onde desagua o rio Yapeyú, com uma população de índios que já havia recebido a primeira doutrinação pelo Padre Roque. Foi a última povoação descendo o rio Uruguai e, por isso, importante entreposto no caminho para Buenos Aires. Contava, em 1657, com uma população de 1.828 pessoas.

No início do século XVIII, a população havia atingido quase 10 mil , a maioria com charruas origens bohanes, yaros e chandules (Guarani das ilhas), mas predominou a síntese cultural hispanoguaranítica (por exemplo, a língua falada na maioria das vezes era Guarani misturado com espanhol e até latim).

Foi nesses anos que Yapeyú se tornou a sede do superior dos jesuítas nas missões.

A população dedicava-se principalmente à fazenda e criação de gado selvagem capturados entre rios Uruguai e Paraná. Em 1657 foi fundada a estância Ibicuy, em territórios atualmente brasileiros com animais: a "Vaquería del Mar". Em 1694 esta foi transferida para a foz do Cuareim e foi abandonada a Vaquería del Mar. Desde 1740, entre San Pedro e YAPEYU foram estabelecidos os postos: San Martín (para ovelhas), San Jose (criação de cavalos) , St. Xavier (mulas), San Isidro (criação de vacas laticínios), San Felipe (criação de gado) e San Jorge Alonso e para a criação de éguas. Em 1767 Yapeyú ultrapassou 60 mil cabeças de gado. 

San Javier (1629)

San Francisco Javier, fundada pelo Padre Jose Ordenes, sobre o arroio Tabituí, na margem direita do rio Uruguai, nunca sofreu mudanças de localização. Por algum tempo nessa Redução funcionou a imprensa missioneira, no século XVIII.

Situa-se nas margens do rio Uruguai, onde faz fronteia com a cidade brasileira de Porto Xavier. Na Páscoa, recebe milhares de turistas de Misiones, Corrientes, Paraguai e Brasil, que fazem uma peregrinação até o Cerro Monge, onde há uma capela e um calvário.


La Cruz (1630)

La Cruz foi fundada em 1630 pelo padre jesuíta Cristobal Altamirano, em um lugar chamado Asunción de la Cruz de Mbororé, próximo ao rio Ibicuy, região do Tape, Missões orientais. 

Diante do constante ataque de Bandeirantes de São Paulo veio primeiro êxodo de pessoas para o local onde Yapeyú foi erguido; em seguida, entre 1638 e 1639 - devido à intensificação dos ataques de Bandeirantes, "Cruceños" abandonaram sua sede primitiva na área onde está localizada hoje Itaqui e atravessaram o rio Uruguai refeito no Ocidente, no local adotado como final. Foi o Padre Cristóvão Altamirano, auxiliado pelo Padre Pedro Romero quem fizeram a migração e organizaram a nova povoação. Nessa Redução havia extração de pedras.

La Cruz é um município localizado na província de Corrientes. É a capital do departamento de San Martín.

San Carlos (1631)

San Carlos de Caápi, foi fundada no início de 1631, pelos Padres Pedro Mola e Filipe de Viveros, no atual Campo de Santo Cristo, ao norte da atual Santo Ângelo-RS, na base da serra, ao norte do rio Ijui Grande.

Teve como nomeados para dirigi-la, a partir de 1636, os Padres Pedro Mola, Diogo Ferrer e Nicolau Inácio. Nessa época o povoado contava com 6.000 almas, até que em 1638 foi atacado e destruído por bandeirantes paulistas. 

Com o ataque bandeirante transferiu-se para o outro lado do rio Uruguai (atual Argentina), próximo às nascentes do Aguapey. Em 1657 havia 2.183 habitantes e 55 armas de fogo.

O povoado mantém a igreja de grande valor histórico e Museu de Arte jesuíta. A cidade mantém o estilo colonial.

San Ignacio Miní (1632)

  
Museu no interior do sítio arqueológico

San Ignácio Mini está localizada a 56 km de Posadas e é a mais preservada das missões jesuíticas argentinas. Ela foi fundada em 1610, no norte do Paraná. Devido aos permanentes assaltos e ataques dos bandeirantes, em 1631 a redução teve que se deslocar para as margens do rio Yaveviri, na Argentina. Como o lugar não era bom, ela foi novamente deslocada, entre 1695 e 1696, para o local onde atualmente estão as ruínas. Em sua localização definitiva, San Ignácio Mini chegou a abrigar mais de 4 mil índios.

O sítio arqueológico possui o maior conjunto urbano preservado das Missões, e permite uma boa noção dos diversos ambientes e espaços que a constituíam as reduções. 

Na entrada há um ótimo museu com peças de artesanato esculpidas pelos indígenas, utensílios domésticos e outros materiais que eram produzidos na redução, além de materiais ilustrativos que possibilitam uma ótima compreensão do período missioneiro.

Santo Tomé (1632)


Santo Tome proveio da Redução do mesmo nome, fundada pelos Padres Luis Ernot e Noel Berthot, em 1632, na margem direita do rio Jaguari. 

O primeiro local da aldeia jesuítica de Santo Tomé foi no Tape (território hoje brasileiro) e conduzido pelo Padre Luis Ernot SJ. O próprio sacerdote é responsável por sua transferência em 1638 para sua atual localização, sob a pressão dos Bandeirantes Paulistas, com a ajuda de milhares de famílias indígenas.

Transmigrou para junto da margem direita do rio Uruguai, onde permaneceu. Foi a que maior população teve inicialmente, cerca de três mil pessoas e, em 1657, contava com 3.494 habitantes e possuia 32 armas de fogo.

Nuestra Señora de Santa Ana (1633)

 

Vestígios e pedras cobertas por mato são encontrados em Sant'Ana e Loreto, que contam com o apoio de pesquisadores das principais universidades européias. Além dos vestígios arqueológicos, grande é a beleza dos lugares, com as ruínas todas tomadas por matas naturais. Foi em Sant'Ana que ocorreu a filmagem de “A Missão”, protagonizado por Robert de Niro.

O primeiro fundamento da missão de Santa Ana remonta a 1633 no atual Brasil. Após as invasões dos bandeirantes em 1660, estabeleceu-se no local final. 

Preserva um dos vestígios arquitetônicos mais volumosos. Os remanescentes da sua arquitetura possibilitam conhecer: praça, igreja, prefeitura e cemitério, lagos, pontes e tanques.

É Monumento Provincial desde 1969, Nacional desde 1983 e Patrimônio da Humanidade desde 1984.


Candelaria (1637-1665)


Candelária, fundada em 1627, pelos Padres Pedro Romero e Roque Gonzalez, no Caazapa Mini, emigrando depois para a região do rio Yqua-Rupá, afluente do Paraná. 

A redução chegou a ser a capital das missões. Ali residiu o Superior das Missões, com seu escritório administrativo e armazém geral, que supria todas as reduções. Também era a que continha maior número de Padres e Irmãos.

Os restos mais monumentais estão na Unidade Prisional. Correspondem a sede do superior dos jesuítas e oficinas, e têm uma altura de entre seis e sete metros. A nível da fundação são resgatáveis ​​algumas faixas de Habitação, partes do templo e a Horta.

Apóstoles (1638)


Santos Aposteles ou Aposteles San Pedro e San Pablo, teve origem na Reduçao Navidade, da serra do Tape, que havia sido fundada pelo Padre Diego de Alfaro, em 1631. 

Em 1638, cruzou o Uruguai, localizando-se próximo do arroio Chimiray. Esse povoado também recebeu emigrados da Redução de San Nicolau, formando um bairro separado. A contagem realizada em 1657, pelo Visitador Real, Dr. Juan Blasquez Valverde, somou uma população de 3.239 pessoas e 65 armas de fogo.

Os únicos vestígios detectáveis são  Oficinas e um setor com casas em condições originais, além do piso do templo (localizado na praça pública).

Persistem os restos de um túnel subterrâneo, semelhante ao de Santa Maria la Mayor.

San José (1638-1660)

São José originou-se da antiga povoação fundada pelo Padre José Cataldino, no Tape, que teve de migrar em 1638 para o outro lado do Uruguai, situando-se entre as Reduções de Corpus e San Ignácio Mini, para depois localizar-se próximo das povoações de San. Carlos e Aposteles. 

Do templo são muito poucos vestígios, mas é um plano reconhecível. Assume especial importância a cripta, cujo acesso é evidente ao nível do solo na sacristia do templo. O setor do presbitério, sacristias, laterais e frente com escadas é reconhecível pelos bastante elevados montes de adobe.
As casas dos índios e as Oficinas estão intactos, com suas paredes de adobe demolido, inclusive sendo capaz de distinguir divisões internas.
Na área da Habitação dezesseis fileiras que têm suas bases de pedra e adobe podem ser observados.

Mártires (1639)

Santos Mártires do Japão (Japón), teve origem com retirantes de diversas Reduções, os quais formaram esta nova povoação, que se instalou próxima à povoação de Santa Maria La Mayor, em 1639. 

Algumas paredes pertencentes à sacristia e o presbitério persistem. As oficinas são notáveis por seu tamanho. Os muros da quinta (horta) são íntegros e os do cemitério também. Na periferia continua a ser visto fábricas de tijolos, lagos e lagoas, etc. No campo da Habitação, as paredes têm resíduos importantes, como casas e algumas fundações de pedra.


No próximo post, finalizaremos este passeio pelos 30 povos com os Sete Povos das Missões, as Missões Orientais, a leste do rio Uruguai.

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